Não me tome como um oportunista que está aproveitando o momento para poder soar como alguém diferente. Não é isso, eu senti muito a sua partida. Para mim e para muitos que não conheciam os detalhes de sua vida, o que aconteceu com você foi algo inesperado.
Olha, Nara, você tinha idade de ser minha filha e eu já corri o perigo de perder meu filho, por isso, talvez, esteja sentindo de forma especial o que lhe aconteceu. Sei que mal nos conhecíamos, embora nos encontrássemos todos os dias. Como estava sempre envolto com meus problemas e com meu corre-corre, não nos dei oportunidade de nos encontrarmos de fato. No entanto, Nara, minha filha lhe conheceu melhor, você fazia parte do dia a dia dela, por isso não sei como ela entenderá que não irá lhe encontrar mais nem tampouco o que ocorreu com você. Só que as crianças são capazes de nos ensinar que nada sabemos sobre elas e de compreender o que nós adultos não conseguimos aceitar.
Sei que não podemos lhe pedir nada nessa hora, não é o momento de lhe cobrarmos alguma coisa, mesmo assim, perdoe-me. Perdão, porque diante de nosso egoísmo nos tornamos incapazes de perceber o outro, colocando-nos em uma redoma e imaginando que somente nós temos dificuldades, que apenas nós sofremos ou que nossos fardos são os mais pesados. E onde está o outro? Do nosso lado, só que não nos damos conta disso. Por esse motivo, perdão, Nara.
Saiba, Nara, que sua caminhada foi interrompida de forma inesperada, mas que você voltará. Sua história não terminou, ela apenas deu uma parada. Sei que os obstáculos que encontrará não serão menores do que aqueles com que você se deparou até aqui, daí sua missão será ainda maior. Não tenho como dizer conscientemente se já tínhamos nos encontrado antes ou, quem sabe, se ainda nos encontraremos, entretanto lamento que em nosso encontro de agora não tive a grandeza de perceber bem mais a sua presença.
Nara, parece fácil depois de tudo, dizer que se tivesse ideia de como era sua jornada, poderia ter tentado de alguma maneira persuadir você a não desistir e a lutar, a ver que nem tudo é como aparenta. Sei que não adianta muito agora, porém queria lhe confessar algo: não foi você a única a pensar em desistir, em um momento de angústia, de desespero, eu também já pensei assim. Queria que soubesse disso!
Uma vez, Nara, senti medo de perder a pessoa que mais amava e confesso, tomado pelo egoísmo, achando que se a perdesse nada mais importaria, pensei em por fim na minha passagem por aqui. Já sabia até como. Só que aconteceu algo que me fez acordar: o amor por minha filha.
Nara, às vezes a ideia da dor da perda nos parece ser maior do que tudo e, talvez, por fraqueza, não vemos que a maior prova de amor que se pode dar a alguém é buscarmos força para seguirmos em frente. Não obtive esse desejo de continuar em mim, mas no outro, em meu filho por continuar lutando por ele e na minha filha por perceber que a jornada dela estava só começando e que eu não poderia deixá-la sozinha. É certo, Nara, que nossas "histórias" são bem diferentes; no entanto, se tivesse percebido sua presença, quem sabe se não poderia ter contado a você a minha história e, acima de tudo, ouvido a sua. Por isso, perdão, Nara.
Você era tão jovem e com um longo caminho pela frente. Não poderíamos ter deixado você desistir, tínhamos que ter tentado convencer você a continuar, oferecendo-lhe muito mais do que lhe demos. Entretanto, somos incapazes, às vezes, de perceber que não estamos sozinhos no mundo e que temos que nos dar as mãos. Seria mais fácil para todos, não acha, Nara? Infelizmente nem sempre isso acontece.
Não sei se essa é de fato uma despedida, quem sabe nossos caminhos não se cruzarão de novo um dia, em algum tempo. Espero que, tendo a oportunidade de lhe encontrar novamente, possa ter a grandeza de perceber muito mais sua presença. Sentiremos sua falta e de onde estiver, procure ver o quanto você era importante e o quanto nos vai fazer falta. Um grande abraço de todos nós e em especial de Clarinha.
Marcelo Macêdo e Clara
P.S.: Nara, sei que aparentemente mal nos conhecíamos, mas saiba que estou sentindo muito a sua partida, não sei lhe dizer ao certo por qual razão, talvez, porque você poderia ter sido minha FILHA!